Resposta #2: Aspirante a Game Designer (Parte 2)

Bem-vindo de volta. Se você perdeu a primeira parte desse Pinheiro Responde, leia aqui antes de continuar. Retomamos a pergunta, com uma etapa importante: colocar a mão na massa. Agora você já conhece vários jogos, já amadureceu como jogador e, com alguma sorte, sabe qual é o seu gosto. Então, chegou o momento de colocar sua ideia em prática.

Ou melhor, escolher uma ideia para colocar em prática. Se você jogou 150 jogos e, de fato, anotou suas ideias. Você deve ter pelo menos umas 10 ideias de jogos. Isso é muito importante, pois o Game Designer não é a pessoa com uma ideia só ou de um jogo só. Eu, pelo menos, enxergo desta maneira. Em todo caso, como você tem uma lista chegou o momento de escolher um desses jogos para ser seu primeiro jogo. Essa escolha é bastante importante, pode definir se você vai conseguir terminar ou não o seu primeiro jogo. Quais critérios utilizar? Vamos evitar alguns dos jogos.

  • Evite ideias complexas, quando mais complexo um jogo, mais difícil será de elaborá-lo, especialmente se for uma simulação;
  • Evite jogos que você possui pouca bagagem, isto é, jogos que você não conhece muitos similares;
  • Evite jogos com muitos componentes, apesar de muitos componentes não serem um sinônimo para jogos complexos, normalmente é;
  • Evite começar pelo seu “xodó”, deixe seu sonho para quando for mais experiente, assim será mais fácil engavetar seu primeiro projeto caso dê errado;
  • Evite criar um jogo baseado em um tema específico, em geral jogos com temas ricos demandam muito mais tempo para serem criados e pode ser um processo exaustivo, opte por um jogo mais focado nas mecânicas;
  • Evite inovar demais, sua fase de experimentar vai chegar, não comece com um experimento.

Perceba que tudo isso são sugestões para facilitar seu processo daqui em diante, mas você pode ignorar alguns desses critérios. Se você se sentir ousado, pode até ignorar todos. O principal objetivo desses critérios é fazer você escolher uma ideia que seja possível terminar em um tempo razoável. O combustível do Game Designer é ver suas criações com vida. Então, quanto mais cedo você conseguir criar seu primeiro jogo, mais rápido você fará o segundo, terceiro… Caso contrário, se seu projeto for um entrave, talvez você fique preso nesse primeiro jogo por anos. E, sejamos honestos, a probabilidade do seu primeiro jogo ser excelente é bem baixa. Então, vamos terminar alguns jogos razoáveis e bons, para depois começar a criar pérolas.

Pois bem, uma vez escolhido uma de suas ideias, chegou o momento de mandar ver. Sendo que a questão é justamente essa. Muitos não sabem como ou por onde começar. Comece pensando como será o seu jogo. Qual o objetivo? Quantos jogadores? Você precisa criar um universo para o seu jogo e delimitá-lo. Caso contrário, você ficará vagando sem saber como dar andamento no seu jogo. Amadureça a ideia todos os dias, sempre anotando, de modo compreensível, como será o seu jogo. Todas essas anotações podem lhe ajudar a escrever um manual bem simplório, mas se isso for demandar muito tempo seu, recomendo pular o manual por enquanto.

Coluna Prototipando pode lhe ajudar na elaboração dos componentes do seu protótipo com vídeos rápidos e simples.

Após alguns dias, ou até mesmo no mesmo dia, você terá definido as mecânicas básicas e terá um conceito global do jogo. Resta ver se a ideia funciona realmente. Como fazer isso? Você precisa criar um protótipo. Primeiro, colete peças dos jogos na sua coleção. Muito provavelmente não será possível conseguir tudo, especialmente em jogos que precisem de componentes impressos, como Cartas, Tokens e o próprio Tabuleiro. Talvez você precise de dados personalizados. Elabore tudo, mas não se preocupe em encontrar arte ou deixar algo com o design gráfico arrojado. Nesse momento, você quer o protótipo preparado o mais rápido possível. Inclusive, se você não tiver tempo para preparar um dado personalizado, pode utilizar dados convencionais e criar uma tabela de conversão de símbolos (1 = Ataque, 2 e 3 = Defesa, etc). Vale qualquer gambiarra para que você coloque seu jogo na mesa para testá-lo.

Agora que você tem um protótipo capenga, mas funcional do seu jogo, chegou a hora de testá-lo. Não, não chame os amigos. Você vai testar seu jogo sozinho. Isso mesmo, você irá simular os vários jogadores na partida e verificar o andamento da partida. Se você ainda estiver se perguntando como vai jogar seu jogo sozinho, talvez com um exemplo real você compreenda. Essa é uma etapa crucial, analise seu jogo com o mesmo olhar que você dedicou aos 150 jogos que você jogou antes. O jogo quebra na primeira rodada? Corrija os problemas e teste novamente sozinho. O jogo não faz muito sentido? Corrija os problemas e teste novamente sozinho. O jogo está muito lento e não termina nunca? Corrija os problemas e teste novamente sozinho. Acho que você entendeu que você vai precisar repetir esse processo. Vai repetir até que seu jogo esteja jogável. Caso isso não seja possível ou você julgue que irá demorar uma eternidade você atingiu a segunda barreira “mental” do processo. Você tem três opções: insistir nesse jogo, engavetá-lo e iniciar outro, ou desistir de criar jogos? Reflita bem. Se você se divertiu durante o processo, eu recomendo que continue suas criações, resta você decidir se continuará com esse primeiro jogo ou pulará para outra das suas ideias. Dependendo do quão problemático for seu primeiro jogo, eu recomendo abandoná-lo e iniciar um novo projeto. Entretanto, se você achou o processo até o momento um tanto quanto difícil ou pouco empolgante, é melhor desistir. Essas primeiras etapas são as mais divertidas de todo o processo, se você não estiver extremamente empolgado com elas, criar jogos não é algo que você deveria perseguir. Afinal, para trabalhar com algo que não nos empolga, é melhor trabalhar com algo que pague as contas.

Coluna Testando Jogando apresenta o ciclo básico do Playtest e algumas dicas que podem lhe poupar alguns percalços.

Se você seguiu com sua criação, eventualmente você conseguiu que o jogo funcionasse com você jogando sozinho. Não precisa ter sido o primeiro projeto, pode ser o segundo, terceiro ou até mesmo o décimo. A partir do momento que você conseguiu terminar uma partida solo e estiver satisfeito com a duração e jogabilidade, o jogo está pronto para ser apresentado aos seus amigos. Infelizmente, alguns jogos você vai precisar consultar seus amigos antes dele de fato estar “pronto” para ser apresentado. Em especial jogos que você não consegue jogar sozinho. Por exemplo, um jogo como Codenames é um pouco inviável testar só. É possível? Sim, mas precisa de uma excelente capacidade de abstração. Talvez, antes de apresentar aos seus amigos, você queira pelo menos deixar seu protótipo legível, isto é, cartas com textos impressos em vez de escritos à mão; aquele dado personalizado finalmente feito, em vez de precisar da tabela de conversão; e qualquer outra funcionalidade que facilite a vida dos seus amigos. Afinal, são seus amigos, eles não precisam sofrer durante o teste, não mais do que o necessário. O ideal é que seus amigos sejam jogadores como você, isto é, conheçam alguns jogos de tabuleiro modernos. Caso contrário, a avaliação deles do seu jogo será longe da realidade.

Pronto, a partir desse momento você é um Game Designer. Você criou um jogo e algumas pessoas jogaram ele. Pode não ser um jogo excelente, raramente os primeiros são, mas é um jogo. Quais são os próximos passos? Bom, você precisa saber explicar bem o seu jogotestar com desconhecidos, pensar na viabilidade do seu jogolevar seu jogo em eventos, escrever as regras, fazer Blind Playtest, e uma série de outras coisas. Achou que tinha terminado? Não, você só começou sua aventura. Depois de algum tempo você estará com vários projetos e seguirá seu caminho rumo a publicação.

O que mais posso falar? Sei que a resposta foi extremamente longa, mas espero que ajude novos Game Designers a saberem, um pouco, o caminho das pedras. Deixo aqui um convite para que você acompanhe o blog, pois o conteúdo é constante e provavelmente permanecerá sendo útil na sua jornada. Sinta-se à vontade para contribuir com as nossas discussões, sejam elas antigas ou novas. Um abraço e sucesso.

2 Comments

  1. Hudson Moraes
    15 de fevereiro de 2024

    Os blogs deveriam ter ferramentas que nos permitissem “curtir/dar like” nas postagens. Seria bom se tivessem.
    Outro texto excelente sobre o qual não tenho nada a acrescentar. Apenas anotar as dicas e procurar seguir.

    Responder
    1. Roberto
      15 de fevereiro de 2024

      Pelo menos tem comentário, né Hudson? hehehe Obrigado pela curtida em palavras. Abração.

      Responder

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