Diário do Designer: Regicida (Parte 3)

Caiu de paraquedas? Perdeu as duas primeiras partes? Antes de prosseguir, leia a Parte 1 e a Parte 2. A jornada é longa, vamos para o terceiro ato.

ATO 3: Retorno


16/03/2020 – Início da Quarentena

Nesse dia eu comecei a quarentena por conta do Corona Vírus. Em Juazeiro do Norte as coisas estavam bem tranquilas ainda, mas tenho uma senhora de todos os grupos de risco possíveis em casa. Então, aderi a quarentena desde cedo. Coloquei essa data como referência, até mesmo pela quarentena ter motivado algumas das ações a seguir.


06/04/2020 – Decisão de Self-Publish

Passado quase um mês em quarentena, eu comecei a pensar sobre a vida. Já comentei sobre essa decisão em uma postagem anterior no Pinheiro Diário. Então, vou passar por aqui mais rapidamente. Basicamente, após reflexão, percebi que eu poderia parar de achar ruim a não publicação do Regicida e tirar algo bom disso: fazer por conta própria.

O jogo estava pronto, tinha aval de terceiros e era pequeno. Não havia porque não tentar. A priori essa decisão fervilhou minha cabeça de ideias. Comecei até a pensar em expansões. Entretanto, dei um passo para trás e decidi que o jogo deveria se ater às origens. Isso, obviamente, não iria me impedir de desenvolver mais o jogo, mas eu queria manter a mesma quantidade de componentes. Seria uma excelente oportunidade ter pleno controle sobre o jogo e redefinir alguns detalhes.


14/04/2020 – Estudo de Viabilidade

No tempo que decidi publicar o jogo por conta própria até aqui, eu estive pensando em como seriam vários aspectos que eu nunca tinha pensado muito sobre o jogo. Como seria a arte? Ambientação? Quais os componentes? Várias questões com relação ao produto final que eu não havia me perguntado tanto assim antes. Isso me deixou vagando muito no mundo nas ideias por uma semana e só agora eu tinha aterrissado.

Clique na imagem para ampliar. Screenshot do site da Ludens antes deles tirarem os preços do ar. Como você pode ver, 70 tiles de tamanho 40x40mm por menos de 10 reais. É um bom negócio, não é?

Então, resolvi ir atrás de um orçamento. Você precisa saber quanto o jogo vai custar por várias razões. Saber se é viável, saber quanto será o valor para o consumidor final e uma série de outras coisas que eu não tenho a menor noção de como funciona. Assim, minha primeira pesquisa foi dar uma olhada no site da Ludens.

Descobri que as caixas dos jogos são um roubo, especialmente para jogos pequenos. A caixa poderá custar mais do que todos os outros componentes do jogo e isso me pareceu completamente sem noção. Entretanto, faz algum sentido pelo material usado: papelão duro, uma quantidade relativamente grande de impressão e tudo feito com um acabamento que preste. Em todo caso, ainda achei triste a caixa (que é um componente não essencial) ser mais caro que todos os componentes do jogo junto. Isso muda para jogos maiores, mas resolvi começar por um jogo pequeno por razões óbvias.

Em todo caso, após estudar pela Ludens, vi que o projeto seria possível sim de acontecer. Mesmo considerando os valores elevados para as caixas.


16/04/2020 – Alterações (v1.1)

Depois de tanto tempo com o jogo engavetado, as ideias fluíram mais fácil. É sempre bom dar aquela guardada no projeto e retomá-lo. Você vê com outros olhos.

A primeira coisa que mudei foi remover um dos objetivos. Após reflexão, eu percebi um par deles serviria apenas para adicionar uma espécie de fake replayability. Seria um componente a mais desnecessário. Assim, foram removidos os objetivos de Maior Reta e Maior Diagonal, que nada mais são do que casos particulares dos objetivos de Agrupamento e Separação. Esses objetivos tinham a tendência de gerar pontuações baixas e aumentar a quantidade de empates. Como quero evitar empates o máximo possível, foi mais uma razão para remover.

Rascunho inicial. A ideia era que fosse um castelo e no centro tivesse o objetivo da partida.

Depois decidi adicionar um Score Board, pois algo que sempre me incomodou foi a contagem dos pontos no final do jogo. As pessoas se perdiam e terminava que alguém meio que se entregava sem querer avisando que uma determinada Casa tinha mais pontos do que a mesa tinha verificado. Aproveitei e também coloquei o desempate apenas em uma etapa. Isto é, se empatar no objetivo, o desempate é feito considerando apenas as peças brancas no mesmo objetivo. Pronto. Nada de dois objetivos e múltiplas verificações. Talvez você ache que agora dará muito mais empate, mas eu condessei todos os processos de desempate e objetivos nos de maior impacto. Então, no final das contas vão ser menos empates que antes e verificados muito mais rapidamente. E ainda assim, o último critério será uma tal de Linha de Sucessão, que seria um critério de desempate definitivo por partida. É melhor ter apenas esses três critérios fáceis (pontuação normal, desempate e desempate definitivo) para declarar o vencedor do que ter cinco critérios e no final das contas o último critério precisar ser esse mesmo que coloquei.

Outra alteração foi modificar algo no jogo para permitir 2 jogadores. Anteriormente eu tinha feito uma variante bem diferente do jogo original e não funcionou tão bem. Agora, tive uma ideia de supetão. Aquelas ideias que você diz para si mesmo: “como não pensei nisso antes”. Bom, a ideia foi simplesmente colocar o Assassinato para funcionar com apenas uma pessoa apontando. Alterações mínimas e elegantes. Para melhorar, talvez fosse o caso dessa alteração até reverberar para 3 jogadores. Acredito que irá melhorar a experiência do jogo com essa quantidade de jogadores, que sempre achei a mais fraca justamente por conta da necessidade dos dois votos em uma mesa tão pequena.

Ainda não testei nenhuma das modificações, mas estou bem seguro de que todas irão beneficiar o jogo. Especialmente levando em consideração que é um jogo de 20 minutos para até 6 jogadores. Então, é bom reduzir a burocracia e qualquer elemento desnecessário nele. Simplificar é essencial, mais ainda em jogos assim.


17/04/2020 – Conversa com Samanta Geraldini

Depois de tentar orçar o jogo pelo site da Ludens, eu imaginei que seria uma boa procurar dicas com quem já fez isso inúmeras vezes. Como Samanta já escreveu aqui pro blog e tem (tinha) uma Editora, imaginei que poderia me dar uma mãozinha.

O que descobri com ela é que precisava fazer um orçamento real. Isto é, procurar a Ludens por e-mail e especificar bem os componentes do jogo. Ela ainda me recomendou procurar a Color System, a gráfica que fez alguns dos jogos do Marcos Macri da MS Jogos. Também indicou dar uma olhada na Game Maker, mas eles estavam de férias.


18/04/2020 – Nova Capa, Casas e Contato com Ludens

Sempre gostei do nome Regicida. Acho, inclusive, que é um dos melhores nomes de jogos que eu já inventei. Na realidade não inventei tanto assim, né? Mas tudo bem. Então, para mim estava sendo ótimo retomar o nome e a temática. Sendo que como eu iria lançar o jogo sozinho, eu precisava encontrar imagens grátis ou pelo menos de valor baixo.

Eu já havia passado vários dias pesquisando imagens e coletando, mas foi apenas nesse dia que encontrei uma que se encaixava perfeitamente. Até comecei a brincar com ela no Photoshop e o resultado está aí ao lado. Sinceramente, eu achei excelente. Não sou Designer Gráfico, mas acho que consegui fazer um bom trabalho aqui. O problema é que essa arte estava em um site com licenças bem nebulosas. Mesmo você pagando, não seria possível utilizar a arte como elemento principal. E, claramente, a arte era o elemento principal da capa do meu jogo. Não consegui contatar o artista e todo esse processo ficou na pendura.

Enquanto isso, aproveitando a empolgação, comecei a elaborar as Casas. Pensei em pegar nomes dos meus antigos personagens de RPG e Ultima Online. O resultado foi: Avondale, Beahr, Drave, Halvern, Na’Ghar e Tuldor. Se você reconhece algum desses, você teve contato comigo em algum desses cantos que citei. E também já comecei a pensar nos símbolos das Casas e até nos lemas, ao melhor estilo Game of Thrones. Já me disseram na época do desenvolvimento que o tema era muito bom, mas queriam puxar para paródia. Eu não sou muito de parodiar as coisas. Então, a ambientação ficou séria e lógica. Nada de copiar as Casas originais ou colocar alguma piadinha.

Nesse mesmo dia eu também segui o conselho de Samanta e enviei o E-mail para Ludens. Comecei tentando adquirir algumas informações sobre os serviços deles antes de pedir o orçamento.


20/04/2020 – Loucura Momentânea

Com as Casas prontas e ambientação entrando nos eixos, eu tive uma ideia megalomaníaca de fazer um mapa do mundo. Já pensando em usar no futuro em algum jogo maior de Controle de Área ou algo assim. Criar vários jogos no mesmo universo e tudo mais.

Então, fui em busca de artistas para fazer um mapa fodão. Encontrei um deles e o valor pelo mapa era de 100 reais. Valor justo, mas atualmente eu iria usar esse mapa apenas no fundo dos tiles. Um detalhe bem pequeno. Acho que não valeria a pena investir em algo que eu fosse usar em algum jogo lá no futuro que eu talvez nem fosse fazer, né? Cai em mim e consegui não fechar negócio. Dei sorte também, pois o artista não estava lá muito interessado e não se esforçou em “vender”. Parecia que eu tava fazendo favor até. Estranhíssimo. Em todo caso, foi bom para mim. Me poupou uma grana que eu gastaria nada a ver.

Aproveitei que tava na loucura e fui conversar com Renato Simões em busca de conselhos e foi bem produtivo. Descobri uma gráfica online chamada Printi e orçando parte do jogo por lá seria melhor do que tudo pela Ludens. Em todo caso, mesmo fazendo apenas parte do jogo com eles, eu não faço ideia da qualidade. Então, pode ser arriscado, mas que pode valer a pena. Primeiro projeto é assim, vida louca.


22/04/2020 – Novos Tiles

Agora que eu já tinha definido bem as Casas, chegou o momento de fazer os escudos. A minha ideia era montar as seguintes artes: os seis escudos das Casas e um mapa estilo medieval para servir de fundo pros tiles. Os escudos eu fiz eles usando imagens gratuitas e o mapa eu encontrei um de graça Online. Economizei aqueles 100 reais que iria gastar por um mapa personalizado e desnecessário.

O resultado para a Casa Na’Ghar ficou como mostrado na imagem. Apesar de estar simples, acho que vai funcionar bem. Especialmente levando em consideração que os tiles terão apenas 3x3cm. Não faz tanto sentido ter uma arte elaboradíssima que os jogadores não vão poder ver tantos detalhes.

Nesse mesmo dia recebi resposta da Ludens, que não respondeu nada (só me fizeram perguntas em cima das minhas perguntas). Aproveitei o embalo que estavam respondendo o e-mail e pedi o orçamento. Não deram e me pediram meu telefone. Estranhíssimo, foi aqui que comecei a perceber que estava entrando em um buraco que eu não iria curtir muito não.


30/04/2020 – Novo contato com a Ludens

Nesse tempo todo não recebi notícia nenhuma. Sim, mesmo dando o meu número eles não entraram em contato. Pediram para quê? Então, enviei um novo e-mail, sendo ainda mais específico sobre o que eu gostaria de orçar. Detalhei bem direitinho. Era só uma questão deles orçarem e pronto… Mas não. Vieram falar comigo pelo WhatsApp e não me passaram orçamento nenhum. Novamente.

Frustrado com a demora, solicitei nesse mesmo dia um orçamento pelo site da Color System.


03/05/2020 – Artista Freelancer

Aqui foi um momento de virada no projeto. Eu tenho uma amiga que é artista, designer gráfica, boardgamer e game designer que, por uma coincidência sem precedentes, veio me perguntar se eu teria indicações de pessoas atrás de artistas. Eis que eu, claramente, preciso. Ainda mais tendo em vista todas as outras Expertise dela. Fechamos no mesmo dia que ela faria toda a arte do jogo, inclusive o design gráfico de tudo (exceto o manual) e  um mockup da caixa. Se você gostar da arte que vai aparecer daqui em diante nesse Diário e quiser contratar também… É só procurar por Lavínia Underbougth.

É nesse momento que vou destacar algo para quem está tentando produzir seu jogo completamente sozinho. Se você conseguir um preço bacana, vale muito a pena ter o suporte de alguém que entende do assunto. Digo preço bacana, pois arte pode ser algo bem caro. Especialmente, se seu jogo tem muitos personagens e cenários diferentes. Então, é algo também importante de você pensar quando for criar ou lançar seu primeiro jogo sozinho. Claro que nada impede de você fazer, como eu iria, tudo com arte gratuita e edição no Photoshop.

Entretanto, é perceptível o quão melhor fica a cara do jogo. O aspecto fica mais profissional, a arte ficará uniforme e todo o jogo por si só terá uma identidade visual com muito mais sentido. Por mais que eu me esforce, não tem como competir com alguém com anos de experiência e que sabe desenhar. Existe um limite para as montagens do Photoshop, ainda mais se eu for colocar na balança o daltonismo. Resumindo: se tem alguma decisão bem dada nesse processo, foi conseguir uma artista e designer pro jogo.


05/05/2020 – Orçamentos chegando

Fui respondido pela Color System. Até veloz, veio um orçamento completo em pdf todo organizadinho. Eles tiveram um pouco de dificuldade em conseguir entender o que eu queria. Eu provavelmente também não facilitei, pois nunca fiz nenhum trabalho desse gênero. Sendo que foram muito solícitos e ágeis. Excelente atendimento. O valor foi extremamente superior ao que vi no site da Ludens. O que me deixou bem triste, mas não vou dizer que esperava que fosse melhor… Tinham me alertado.

Também consegui, finalmente, um orçamento da Ludens. Foi um Screenshot de uma tabela no Excel e eu tive que pedir apenas o orçamento dos tokens para agilizar. Minha ideia era para confirmar o que tinha no site. E tinha sido bem similar. O problema é que a faca que eu queria não existia mais e o site estava desatualizado. Assim, o orçamento não era definitivo. Entretanto, assumi que não iria mudar muito a configuração dos preços por conta disso. Como eu precisava da arte finalizada para fechar o pedido, optei por aguardar mais um tempo.


11/05/2020 – Capa Pronta

Desde que fechei a arte com Lavínia, ela estava preparando a capa do jogo com base nas minhas solicitações, que foi basicamente fazer algo similar àquela capa que mostrei aqui no dia 18/04. Houveram algumas versões para tentar definir a identidade do Rei Morto.

Eu gostei da roupa do primeiro e da cabeça/coroa do terceiro. Então, o resultado final foi uma mistura dos dois. Optei pelo Rei ter um visual mais neutro, pois a ideia é justamente representar um Rei Morto e não um Rei Morto-Vivo. Não faço ideia se foi uma decisão acertada. Mas se foi errada ou certa, a culpa foi minha mesmo. Até pedi ajuda a uns amigos para darem uma olhada e pareceram concordar comigo.

Em todo caso, foi nesse exato dia que ela me entregou a arte da Capa do jogo. Tendo em vista que falei com ela 03/05 e que ela começou a trabalhar em 04/05… Foi uma semana para esse resultado. Tempo bom, né? Especialmente comparando com experiências passadas. Bom, usarei a imagem da capa para encerrar esse Ato. Afinal, nada mais propício que terminar o Retorno mostrando a nova identidade visual do jogo:

Que tal? Acho que ficou mais cartunesco do que eu tinha em minha mente com a capa que fiz sozinho inicialmente. Entretanto, acho que se adequou muito bem. Regicida é um jogo para até 6 jogadores e que joga em menos de 30 minutos. Não faz sentido ter um visual tão pesado quanto eu tinha elaborado a priori.


FIM DO ATO 3

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