Escrita Expressa de Manuais

Faz quase dois anos que escrevi para essa coluna. Na verdade, considerando que a última postagem foi da Bianca Melyna, realmente faz mais de dois anos que escrevi para essa coluna. Acho que o problema é que eu posso transferir praticamente todo conteúdo sobre Manuais para outras colunas, como a Aprendendo Errando ou agora o Pinheiro Diário. Entretanto, acho que como temos essa divisão aqui no blog, seria o caso de colocar postagens sobre Manuais na coluna Escrevendo as Regras mesmo, né? Bom, como trabalhei em manuais algumas semanas atrás, tive essa ideia de postagem.

Algum tempo atrás eu submeti uma cambada de jogos para uma Editora. Não sei o que vai sair algo daí, mas como iria mandar um, resolvi logo mandar vários. Eles aceitaram receber vários, então, por que não? Entretanto, alguns desses jogos ainda não tinham manual pronto. Como enviei por Correios, eu teria um bom tempo para fazer os manuais e enviar por e-mail antes que chegassem ao destinatário. Sendo que eu só demorei uns dois dias para fazer dois manuais. Fiz manual para Regicida e Sticks & Stones. O primeiro na realidade já tava todo o texto pronto, só que com o tema de ArkMago ainda, sendo que ainda faltavam as figuras (parte mais demorada); já o segundo eu não tinha nada mesmo, ia fazer do zero.

Talvez você diga que fazer dois manuais em dois dias seja algo normal, mas acho que os especialistas irão dizer que não. Se você tem esse pensamento, é porque você realmente não tem noção do quão complicado é fazer um manual que preste. Logicamente eu não sou expert no assunto, mas já tendo feitos alguns manuais e escrito tanto texto, acho que eu consigo expressar minhas ideias de uma maneira lógica e encadeada. Consequentemente, acho que meus manuais são razoáveis. Então, dois dias para dois manuais é algo que eu diria ser rápido e por isso chamei essa postagem de “Escrita Expressa”.

Na verdade, o problema de criar o manual não é tanto pela escrita. É a composição do todo. Escrever um manual puramente com texto e sem ligar para o leitor é fácil sim. Afinal, basta vomitar informações por lá e pronto. É assim que temos os vários exemplos de Kickstarters ou até jogos nacionais com manuais terríveis. A dificuldade de escrever o manual é deixar ele claro o suficiente, isso não significa apenas escrever tudo em todos os detalhes. Pois, detalhes demais também é um problema. Sim, se você explicar algo demais pode até confundir o leitor. “Ué, porque ele ressalta tanto a importância do descarte ir na pilha X? Será que são duas pilhas e eu não percebi?”. Sim, isso acontece.

No final das contas, a escrita do manual demora, pois ela precisa ser feita de modo que um jogador totalmente leigo (que nunca meu um manual) e um jogador extremamente experiente (que já leu centenas) consigam aprender o jogo. E não é simples ou fácil ser didático, ainda mais às cegas. Isto é, sem ter Feedback. Então, a melhor maneira tendo em vista que estamos lidando com um documento com suas limitações de mídia é colocar exemplos com figuras. É por isso que demora tanto sua elaboração. Afinal, saber quais figuras colocar que abordem bem os problemas não é algo trivial, fora que o ato de elaborá-las dificulta ainda mais a situação.

Todo esse preambulo é para dar uma dica que agiliza muito na elaboração de um manual: não use gráficos montados no computador, use fotos. Isso mesmo, fotos. A qualidade “artística” ficará pior? Sim. Se eu for imprimir vou gastar bastante tinta, pois as fotos tem cores no fundo? Sim. O manual vai ficar com uma cara meio estranha e parecendo produto não finalizado? Sim. Esses questionamentos levantado realmente importam? Não. Você está montando um protótipo, não precisa ser o produto final. Na realidade, essa tarefa de montar um manual bonitinho é da Editora e não do Game Designer. Você está somente entregando algo prático, compreensível e viável para que o jogo possa ser avaliado e usufruído em seu estágio atual pré-contrato.

Para demonstrar que os questionamentos não importam, vamos exemplificar com figuras. Inception: exemplificar o uso de figuras com um exemplo de figuras.

Qual foi o meu processo para elaborar o manual de Sticks & Stones? Primeiro eu escrevi todas as regras e fui já pensando nas imagens que iria precisar e anotando no próprio manual. Como eu estava pensando nas fotos, eu já fui colocando no local que queria a foto algo bem destacado: [FOTO CONTENDO X, Y E Z]. Uma vez que o manual está pronto (essa parte não é tão demorada para um jogo simples como Sticks & Stones) e você sabe especificamente quais fotos e exemplos você deseja demonstrar você fará uma sessão fotográfica com o jogo. Tire mais fotos do que precisa, tente até exagerar no detalhamento dos exemplos em termos de foto, pois é melhor descartar fotos depois do que ter que ir tirá-las de novo. Cuidado na hora de tirar as fotos para não deixar algo quebrando a regra do seu jogo. Muitas vezes os jogadores utilizam a foto para conferir as regras de modo rápido. Quem nunca, por exemplo, olhou a foto de uma Preparação para ver quantas moedas um jogador começava ao invés de ler no texto? Se a quantidade estiver errada na foto, o jogador vai jogar errado. Então, tenha esse cuidado. Sempre esteja simulando a partida corretamente e seu jogo ficará seguro.

Inclusive, a foto entra com uma vantagem adicional: evita a preguiça. Como assim? Em Ciberguerrilha eu preparei tanto diagrama que chegou no momento de preparar um exemplo de pontuação e fiz tudo usando texto. Seria muito melhor fazer um exemplo usando alguma figura, correto? Óbvio. Não fiz meramente por cansaço do tanto de esforço feito para montar os demais exemplos do manual. Sticks & Stones não sofreu desse mal. Bastou uma foto de uma simulação e voilà.

Resumindo: quer montar um manual perfeitamente útil em menos tempo? Use fotos. Use várias fotos. A vantagem disso tudo vai além: no final da sessão fotográfica é bem provável que você tenha feito um Playtest Solo de rebaba. É isso. Até a próxima.