Uma metodologia de Playtest Solo: Parte 2

Semana passada você deve ter lido a Parte 1 dessa metodologia. Até o momento testei o jogo três vezes sozinho e já fiz diversas alterações nele. Hoje, continuamos com os testes e, ao final, fecho com algumas dicas resumindo o processo.

No quarto teste eu percebi que estavam faltando mais pontos nessa salada. Então coloquei incentivos para Set Collection por cor e por números. Assim, não bastava ter a maioria em cores, era importante balancear alguns aspectos. Com isso, surgiram mais três caminhos estratégicos. Nesse estágio, a pontuação desses diversos caminhos era um chute estimado. Com base em cálculos por outras vias de pontuação. Não estava perfeitamente balanceado, mas pareceu decente. Tendo em vista o incremento dos caminhos, eu optei por testar com 4 jogadores a partir desse ponto. Assim, eu poderia testar várias estratégias diferentes para ter uma noção de balanceamento.

Para fazer esse teste de balanceamento, eu escrevi em um papel a estratégia que seria empregada por cada jogador. Deste modo, o jogador sempre iria focar nessa estratégia, mesmo que existissem outras opções que parecessem dar mais ponto no momento. Porque optei por fazer assim? Simples. Eu queria ver se existiam estratégias bitoladas muito fortes. Testei. Pontos foram reduzidos de algumas estratégias, aumentado em outras.

Trecho do resumo das regras. Uso dos recursos e esquema de pontuação na 8ª versão.

Esse Playtest não serviu apenas para balancear as pontuações. Houve mais modificações para o azul, que eventualmente foram descartadas, pois não ficaram boas. E foi introduzido um segundo recurso: Martelo. O Martelo é basicamente os recursos para fazer as construções. Foi a maior modificação, pois antes as construções eram restritas à Rampa e Polia, para construir os vários andares da Pirâmide; agora as construções tinham habilidades ativas e passivas e foi criado todo um tabuleiro a parte para elas. Se não me engano eram 12 construções.

Testei novamente com 4 jogadores e foi assim até os últimos Playtests solo. Como o dado amarelo dava um tipo de recurso, o dado cinza também, eu pensei… Porque não colocar o dado azul como um recurso? Assim surgiu o terceiro e último recurso do jogo: Livro. O jogador passou a gastar Livros para comprar Objetivos e alterar a cor do dado. Deste modo, finalmente o dado azul se consolidou no jogo, deixando de ficar deslocado. Novas alterações foram feitas nas pontuações, o dado verde foi simplificado. Antigamente era possível comprar vários trabalhadores, optei por manter apenas um. Isso reduz o custo do jogo e aumenta a necessidade de planejamento para empurrar os Blocos. Win win. Coloquei a opção de Destruir Blocos com Martelos, assim permite que jogadores que tenham planejado incorretamente possam “refazer” sua Pirâmide, em vez de ficarem travados. As construções passaram por alterações e novas construções foram inseridas. A partir desse ponto, uns 2 ou 3 Playtests solo foram realizados para ajustes mais finos, como aumentar ou diminuir algum custo em Martelos ou Livros e ajustar algumas pontuações discrepantes demais.

Durante essas várias versões o design do tabuleiro pessoal também passou por modificações. Foram criadas as trilhas de recursos quando os recursos foram necessários. Foi modificado o espaçamento da Pirâmide, para comportar os dados de uma maneira mais concisa. Sendo que após todos esses Playtests, eu estava bastante satisfeito com a situação do tabuleiro pessoal. As únicas modificações estavam sendo nas Ações, custos e pontos de vitória. Para evitar tantas modificações no tabuleiro pessoal, optei por fazer uma Carta de Ajuda com todas as Ações e custos. Assim, em caso de modificação, apenas mexeria nessa carta de ajuda. E com isso, pude fazer um tabuleiro pessoal mais bonitinho, que mantenho até hoje, pois não foi necessária mais nenhuma modificação nele. Também deixei as construções em um tabuleiro separado, assim eu poderia modificar o texto e custos quando quisesse. Me deixando livre das amarras gráficas do tabuleiro pessoal.

Teotihuacã com tabuleiro pessoal mais elaborado e demais elementos (tabuleiro de construções e carta de ajuda) sem gráficos para facilitar alterações.

Com o tabuleiro pessoal pronto e bonito, testei mais algumas vezes e fiz mais ajustes. Eventualmente, resolvi apresentar aos amigos. Citei até alguns detalhes dessa experiência na Lição #28. Depois de um tempo, eu retomei os Playtests solo do Teotihuacã para criar uma variante solo. Deste então, o jogo não passou por mais Playtests solo e já foi apresentado em eventos, onde recebi Feedback de desconhecidos.

Massa Roberto, mas essas duas postagens ficaram parecendo um Diário do Designer. Eu li tudo, mas talvez tenha sido muita informação solta e provavelmente não conseguirei aplicar. Você tem razão, caro leitor e vou resumir aqui umas ideias e dicas:

  • Monte um protótipo e teste ele sozinho. Não precisa terminar a partida, apenas identifique os principais problemas e tente verificar se a ideia base do jogo funciona.
  • Corrija os problemas mais graves e repita o processo enquanto houver retorno, isto é, enquanto encontrar novos problemas.
  • Quando o jogo estiver fluindo bem, jogue até terminar uma partida. Se a partida estiver muito longa, tente ajustar os parâmetros que reduzam esse tempo (quantidade de turnos, objetivo final, etc).
  • Até o momento é recomendado testar simulando poucos jogadores, pois nesse momento ter mais jogadores apenas irá atrasar seu progresso.
  • Teste várias vezes para corrigir os problemas mais notáveis até que o jogo tenha um fluxo interessante.
  • Quando o jogo estiver sem problemas notáveis de jogabilidade, você poderá partir para um balanceamento relativamente simples. Nesse balanceamento, jogue com o máximo de jogadores possíveis e coloque cada um desempenhando um caminho estratégico. Altere os números e repita o processo até estar satisfeito.
  • Depois de todo esse procedimento você terá pelo menos uns 10 Playtests solo. Chegou o momento de mostrar o jogo aos amigos.

Finalmente chegamos ao fim dessa jornada. Espero que tenham gostado da leitura e que tenham extraído algum conhecimento útil para utilizar em suas próprias criações.

4 Comments

  1. Matheus Ulisses Xenofonte
    27 de dezembro de 2017

    Bem longo, mas valeu a pena a leitura. É legal “espiar” como funciona o raciocínio de outra pessoa nesse aspecto de game design, ajuda muito a deixar o seu mais afiado.

    Responder
    1. Roberto
      27 de dezembro de 2017

      Comparar notas e metodologias é sempre bacana. Serve de aprendizado e, às vezes, pode até modificar o modo de trabalhar. =D

      Se essa postagem não ajudar muito com a parte “histórica”, espero que pelo menos os pontos finais sejam úteis.

      Responder
  2. Germano
    7 de janeiro de 2018

    Gostei bastante das dicas. Principalmente a de colocar cada jogador seguindo um caminho estratégico para “ver se existem estratégias bitoladas muito fortes”.

    Responder
    1. Roberto
      8 de janeiro de 2018

      Que bom Germano. Agora é só aplicar. =D

      Responder

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Scroll to top