Diferentemente do Dice Placement, eu não estou tão familiarizado com os jogos de Worker Placement que possuem trabalhadores diferentes, isto é, trabalhadores que possuem habilidades diferentes ou podem ser aprimorados ou que possuem restrições de acesso aos locais de alocação. Engraçado que já até iniciei um jogo com essa mecânica, mas abandonei o projeto. Bom, em todo caso, mesmo sendo uma diferença de conhecimento grande para a Mecânica #15, trarei o que der com meus conhecimentos.
Aproveitar que estamos falando ainda de Dice Placement e botar um comparativo com a mecânica atual:
A comparação que foi feita na postagem anterior foi um pouco injusta. Entretanto, agora, acho que há justiça sim nesse gráfico. Afinal, ambas as mecânicas são inserções novas no BGG. Por consequência, ambas devem estar desatualizadas. Eu imaginei que Dice Placement tivesse mais jogos, mas me enganei. Bom, ao menos de 2015 para cá. Entre 2001 e 2005 há uma discrepância, simplesmente por existir um jogo lançado com Different Worker Types: Keytown (2000). Sim, mais um jogo da série key, do Richard Breese, que parece estar sempre inovando. Reza a lenda que Keydom (1998) foi o primeiro Worker Placement, agora vemos que o Game Designer também parece ter sido o precursor dessa variação da mecânica. Infelizmente, não conheço nenhum dos dois.
Eu diria que Different Worker Types tem um pouquinho mais por ser algo mais abrangente. Se você já não esqueceu o que eu falei no começo, pode ser trabalhadores diferentes ou trabalhadores que possam ser aperfeiçoados ou trabalhadores que tenham restrições de espaços diferentes. São opções mais vastas do que “apenas” ter um componente específico para o trabalhador, no caso o dado… Inclusive, é possível um jogo ter as duas variações presentes: Dice Placement e Different Worker Types. Teremos alguns nos exemplos.
Eu acho que os pontos positivos dessa mecânica vai ser um pouco mais difícil de pensar. Obviamente, tem os mesmos do Worker Placement. Mas o que teria além?
- Ampliação: você com certeza terá mais espaço de design, seja para pensar em habilidades especiais ou simplesmente pensar em locais de alocação específicos e que leve em consideração dos diferentes tipos de trabalhadores;
- Estratégico: o jogador vai precisar pensar quando e qual trabalhador alocar e isso já pensando se esse ou aquele espaço estará disponível pro futuro, pois se não tiver os planos dele já não vão funcionar muito bem, especialmente se o tipo de trabalhador restringir os locais de alocação. Imagine que você pensou em alocar no seu 3º turno o trabalhador especial 2 no espaço que só ele pode ir, mas já estava ocupado? Deu ruim;
- Mais temático: os jogos Worker Placement já possuem uma conexão com tema interessante, pois é tudo muito intuitivo e tudo faz sentido, há pouca abstração. Ao inserir trabalhadores específico isso pode ficar ainda mais temático, pois em vez de alocar apenas um trabalhador qualquer, você está alocando um gerente ou um funcionário ou um chefe de departamento, tudo se alinha ainda mais.
Ora, até que não foi difícil pensar nesses pontos. Isso é um bom sinal, pois demonstra que a mecânica realmente tem qualidades notáveis e que você deve sim usufruir ao utilizar no seu jogo. Entretanto, cuidado para não cair em algumas armadilhas…
- Balanceamento: vai ser mais difícil balancear seu jogo, pois não apenas você precisa espaços de alocação condizentes e balanceados, mas que os diferentes trabalhadores não sejam exagerados nos seus aspectos positivos (ou até negativos);
- Complexidade: dependendo do seu jogo, inserir essa mecânica pode deixar ele mais mais complexo do que precisa. A vantagem é que se você conseguir se aproveitar da vantagem temática da mecânica, a complexidade não vai pesar tanto, pois fará pleno sentido durante a explicação;
- Novidade: sim, um dos mesmos pontos que citei no Dice Placement. Tudo bem que a mecânica de agora é mais antiga (desde 2000), mas não existem tantos jogos assim com Different Worker Types. O que pode fazer com que você caia em armadilhas.
Rapaz, depois de ver esses pontos positivo e negativos, deu até vontade de voltar ao meu projeto. E olhe que fui eu que “inventei” todos eles, a autorreflexão é uma coisa muito engraçada. Realmente, é uma mecânica singular e que propicia muitas vantagens e com potenciais problemas perfeitamente contornáveis. Então, fica aí a dica para você que tá pensando em criar um jogo do gênero. Pode ser uma boa investir nessa mecânica. Bom que traz um diferencial para seu Worker Placement.
Vamos ver uns exemplos?
Vou começar com um exemplo repetido. Praetor (2014) é um Dice Placement, sendo que você não rola os trabalhadores, os Pips indicam o nível do trabalhador. Logo, também é um Different Worker Types, já que o nível é uma modificação no trabalhador que traz benefícios. Como demonstram as vantagens, isso é bem temático, pois o trabalhador quanto mais trabalha, mais aprende e melhor faz a cada ação. Outro elemento temático é que quando ele iria evoluir do 5 para o 6, ele se aposenta. Bem interessante, infelizmente o jogo simplesmente não funciona, mas são boas ideias e que poderiam ser replicadas em um jogo de melhor qualidade.
Tem um jogo que é listado no BGG como sendo Different Worker Types, mas eu não concordo muito: Tzolk’in (2012). Imagino que o motivo é que seu trabalhador é alocado em um espaço ruim, mas sua ação vai melhorando com o tempo. Sei lá, talvez seja o mero aspecto físico, pois para mim é o espaço que está progredindo e não o trabalhador. Entretanto, se parar para pensar em outros exemplos eu vou discordar de mim mesmo. Vejamos Fallout Shelter (2020), a coisa funciona de maneira relativamente similar, só que o componente de evolução fica no trabalhador e, por consequência, eu acho que faz mais sentido ser Different Worker Types. Então, no final das contas os dois são, né mesmo? Mas como Fallout Shelter funciona? Ele coloca um benefício temporário. Você vai em um espaço, seu trabalhador volta treinado. Isso é indicado colocando ele em frente ao seu tabuleiro pessoal no atributo que ele foi treinado. Assim, ao alocar no futuro você sabe de onde ele saiu e, consequentemente, sabe qual atributo ele está treinado. Sendo que isso fica registrado apenas nesse momento, se perdendo. Então, foi uma vantagem temporária. Eu achei um pouco sem graça, mas funcional. Afinal, qual a graça do seu trabalhador evoluir e depois perder a vantagem adquirida? Mas o mesmo acontece com Tzolk’in, só que talvez o jeito como opera (sem atribuir literalmente ao trabalhador) deixe tudo mais palatável e melhor. Ou vai ver é simplesmente por Tzolk’in ser um bom jogo e Fallout Shelter ser apenas um festival de sorte com uma mecânica meio que de Euro Game completamente mal colocada.
Mais um jogo que trabalha com evolução dos trabalhadores é Chimera Station (2017). Esse, eu acho que é o melhor representante. Não em termos de jogo, mas da ideia e implementação da mecânica. Você mutaciona seus trabalhadores fisicamente (sim, botando pecinhas neles) para indicar suas evoluções e isso irá dar habilidades ao seu trabalhador. Bem interessante conceitualmente, existem mutações que são passivas e outras funcionam na alocação. O problema com o jogo entra justamente no balanceamento, é muita coisa para pensar e acho que não pensaram em tudo… Basicamente você está em busca do combo mais roubado possível para ganhar uns pontos de uma maneira que pode ser completamente oportunista e baseada na sorte ou na falta de observação daquela jogada pelos oponentes.
Raiders of the North Sea (2015) é um que também trabalha com trabalhadores mudando. Eu não diria evoluindo, pois eles iniciam preto, depois viram cinza e depois brancos. Cada um sendo melhor para fazer as invasões, mas o preto é o melhor para usar em casa. Acho que é como se fossem o pessoal da vila e os guerreiros realmente. Acho esse um exemplo meio ruim, até como Worker Placement mesmo por conta da dificuldade de realmente bloquear os jogadores e de ter alguma interação que não seja apenas a corrida pelas melhoras invasões, mas tem muita gente que adora esse jogo.
Certo, mas por enquanto a gente tá vendo apenas evolução dos trabalhadores, não temos trabalhadores realmente com funções distintas? Temos sim.
Acho que The Manhattan Project (2012) foi o primeiro que joguei e que é bem perceptível o que está acontecendo ali. Você tem “evolução” dos trabalhadores, afinal o trabalhador básico é o mais fraco. E tem trabalhadores que realmente ativam espaços distintos, que são os engenheiros e cientistas. Isso incrementa, como esperado e comentado, o tema do jogo. Belfort (2011) tem os elfos que coletam mais madeiras, os anões que coletam mais metal e os gnomos que conseguem ativar umas construções específicas.
Uns exemplos mais polêmicos seriam Keyflower (2012) que também tem disso, mas é tão diferente que alguns podem dizer que não é. No jogo existem trabalhadores coloridos e sua função não é pré-determinada, mas quando alguém coloca o primeiro trabalhador em um espaço, isso determina que apenas trabalhadores daquela cor podem ir ali. Isso é muito interessante, pois é como se a definição das especialidades fosse em tempo real. Isso garante uma interação e nível estratégico bem interessante. Agora, o polêmico mesmo é Troyes (2010), que eu digo que não é bem um Dice Placement, mas… se fosse… Seria com Different Worker Types também, já que existem os dados brancos, amarelos e vermelhos que ativam locais distintos. Inclusive, cada um tem um tema recorrente, o que deixa o tema um pouquinho mais presente, mas não muito.
Muitos exemplos, né? Eu achei que nem ia conseguir lembrar, mas até que a memória funcionou bem. Vou dar mais alguns para você ter mais uns jogos para pesquisar e aumentar seu leque de conhecimentos. Lembro que em Yokohama (2016) cada jogador tem vários assistentes e um presidente. Eu diria que a parte Worker Placement está com o presidente, mas supondo que os assistentes também fazem parte da mecânica (eu discordaria), temos dois tipos distintos de trabalhadores. Um é para potencializar a ação e permitir a movimentação do presidente, enquanto que o outro de fato ativa os locais e pode bloquear os demais jogadores. Já The Godfather: Corleone’s Empire (2017) é mais clássico e perceptível a mecânica. Temos dois tipos de trabalhadores, como se fosse um gangster mais poderoso que o outro. Um influência várias regiões de uma vez e também ativa vários espaços de uma vez (mas uma ação menos potente às vezes) e o outro você precisa mandar para um local mais específico. Sinceramente, esse jogo me surpreendeu e vale a pena conhecer para ver uma boa integração de tema com mecânica e também todo esse diferencial dos trabalhadores junto com uma segunda mecânica no meio. Sim, não é só impacto no Worker Placement, mas também em um Area Majority rolando ao mesmo tempo. Fechando, um jogo que não está listado no BGG como possuidor da mecânica, mas claramente é: Keyper (2017), sim mais um do Richard Breese. Pessoal fala que Uwe Rosenberg tem muito Worker Placement, mas nenhum é necessariamente inovador. Já o Breese… Bom, em Keyper você tem várias cores de trabalhadores como Keyflower, mas aqui eles já estão definidos onde podem ir. Na verdade você pode mandar todo mundo em qualquer canto, mas se for da cor correta você potencializa a ação.
Pronto e para fazer o seu não tem muito mistério. Siga as dicas da Mecânica #1 para evitar as armadilhas do Worker Placement e depois resta ver o que será incrementado no seu jogo para ter os trabalhadores diferenciados. A recomendação que eu daria seria atrelar algo ao tema e começar devagar. Não tente ter uma ideia mirabolante, pense simplesmente nos trabalhadores darem benefícios simples e vai se sair bem. Ao menos para exercitar, claro que o ideal seria ter uma ideia diferente e funcional, mas isso vem com o tempo e prática. Boa sorte.